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Seg, 22 Maio 2023 12:53

Entrevista Nota 10: André Viana e a crescente busca pela harmonização facial

O cirurgião-dentista fala sobre o papel da odontologia na contribuição do bem-estar e explica como funciona a harmonização orofacial, além de pontuar benefícios e alertas sobre o procedimento


Mestre e doutor em Farmacologia, André possui pós-graduação em Harmonização Orofacial e é docente do curso de Odontologia da Unifor (Foto: Arquivo pessoal)
Mestre e doutor em Farmacologia, André possui pós-graduação em Harmonização Orofacial e é docente do curso de Odontologia da Unifor (Foto: Arquivo pessoal)

Segundo o Google Trends, o termo harmonização facial teve um aumento de 450% nas buscas entre dezembro de 2019 e dezembro de 2020. De lá pra cá, o volume de pessoas que aderiram ao procedimento continua em crescimento acelerado. Basta abrir as redes sociais para ver diversos famosos, influencers, algum colega ou conhecido seu que fez — talvez até você já tenha cogitado ou chegado a fazer.

Além da busca pela “imagem ideal”, seja por tendências sociais ou midiáticas, a harmonização orofacial (termo utilizado por especialistas da área) é uma especialidade odontológica que busca restabelecer o equilíbrio estético e funcional da face. Isso significa uma modificação ou correção baseada na harmonia completa do rosto de cada indivíduo.

O cirurgião-dentista Dr. André Viana observa que os pacientes procuram atingir sua melhor versão. “Claro que não podemos fechar os olhos aos aspectos essencialmente estéticos, mas temos que ter em mente que isso reflete em uma procura de elevação da autoestima, melhora na auto aceitação e melhora do bem estar”, esclarece.

Graduado em Odontologia pela Universidade de Fortaleza, instituição de ensino da Fundação Edson Queiroz, ele é mestre e doutor em Farmacologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Também possui pós-graduação em Harmonização Orofacial e é especialista em Oncologia.

Docente dos cursos de Odontologia e de Aperfeiçoamento em Harmonização Orofacial da Unifor, ainda atua como cirurgião-dentista emergencista de uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) em Fortaleza. Ele é membro do Conselho Regional de Odontologia do Estado do Ceará (CRO-CE), sendo presidente da Comissão de Tomadas de Contas e de Fiscalização do órgão.

Na Entrevista Nota 10 desta semana, André Viana fala sobre o papel da odontologia na contribuição do bem-estar da população e explica como funciona a harmonização orofacial, além de pontuar benefícios e alertas sobre o procedimento.

Confira na íntegra a seguir.

Entrevista Nota 10 – Professor, de que forma a odontologia vem contribuindo ao longo do tempo para a promoção não só da saúde, mas também do bem-estar e autoestima da população?

André Viana – A odontologia como ciência, e por meio de sua prática assistencial, é capaz de entregar o termo bem-estar no seu sentido amplo, unindo os aspectos físicos, mentais e sociais. Quando nós, dentistas, tratamos alguma doença dentro da nossa área de atuação, estamos devolvendo a saúde física, restabelecendo a qualidade de vida e, muitas vezes, o equilíbrio emocional de nossos pacientes.

Hoje em dia, cada vez mais nos distanciamos daquele dentista que só trabalhava com dente, ampliamos nosso olhar e cuidado para o sorriso e face. Somos capazes de promover uma transformação na autoestima dos pacientes e uma mudança comportamental. Como não se impressionar com um sorriso bonito? Uma face harmônica? Um processo de envelhecimento de qualidade? A odontologia migrou de uma profissão mutiladora e dolorosa para uma profissão tecnológica, indolor e reabilitadora.

Entrevista Nota 10 – Poderia explicar como funciona a harmonização facial e qual é a diferença entre ela e a harmonização orofacial? 

André Viana – O Conselho Federal de Odontologia (CFO), nosso órgão regulatório máximo, reconheceu a Harmonização Orofacial como especialidade odontológica em janeiro de 2019, por meio da resolução 198/2019. Nela temos previsão legal para o exercício dessa especialidade de forma plena, dentro do rol de procedimentos definidos, sempre com o objetivo de restabelecer o equilíbrio estético e funcional da face. Estamos habilitados a realizar procedimentos diversos, tais como:

  • uso de toxina botulínica (famoso Botox®),
  • utilização de preenchedores faciais (preenchedores à base de ácido hialurônico),
  • utilização de biomateriais para indução da produção de colágeno (fios de PDO e bioestimuladores),
  • terapias como foco na melhoria de qualidade de pele (técnicas de intradermoterapia),
  • procedimentos cirúrgicos e utilização de recursos tecnológicos diversos.

O termo correto seria Harmonização Orofacial, visto que devemos levar uma correção ou modificação baseada sempre na harmonia global da face de cada paciente. 

Entrevista Nota 10 – Quais são os benefícios da harmonização facial e/ou orofacial? E quais os cuidados que precisam ser tomados?

André Viana – A Harmonização Orofacial, também conhecida por HOF dentro do meio odontológico, não se restringe apenas aos aspectos estéticos “supérfluos” ou de “modismo”, pois temos, sim, um foco no processo de correção de deformidades faciais. Não esqueço de uma criança atendida aqui na Unifor que, durante o parto à fórceps, teve uma lesão em mento (queixo) que gerou um grande defeito estético e funcional, impedindo a socialização dele na escola e no próprio olhar ao espelho. Fizemos alguns procedimentos de HOF e ele passou a se sentir igual aos outros, passou a olhar nos olhos dos colegas do colégio e relata que não sofre mais bullying. Claro que não podemos fechar os olhos aos aspectos essencialmente estéticos, mas temos que ter em mente que isso reflete em uma procura de elevação da autoestima, melhora na auto aceitação e melhora do bem estar. Observo sempre que os pacientes procuram atingir sua melhor versão.

Como se trata de procedimentos em saúde, devemos sempre procurar um profissional habilitado na área e com expertise nos procedimentos que venha a realizar. Os procedimentos em HOF são, em sua grande maioria, de baixo risco, porém observamos a cada dia um aumento das intercorrências e, inclusive, morte de pacientes. Esses desfechos são minimizados quando [acontece] a escolha de um profissional experiente, capacitado e ético. Como temos um verdadeiro surto de “injetores” (como são chamados os profissionais de HOF), muitos se apresentam como magos na área, porém rasos na ciência e na técnica e especialista, sim, em redes sociais. Outro aspecto que devemos citar é que, na grande maioria, os insumos utilizados na harmonização são de alto a médio custo, portanto desconfie na oferta de preços baixos. Você pode estar recebendo produtos de baixa qualidade, sem registro na Vigilância Sanitária e até mesmo falsificados.

A procura por profissionais sérios e capacitados também deve ser vista como uma forma de minimizar os procedimentos exagerados ou desnecessários. Uma boa escuta e entendimento dos reais anseios e desejos do paciente se faz necessário nas consultas de harmonização. Compreender os aspectos psicológicos envolvidos na queixa principal é sinônimo de sucesso de resultados. Muitos pacientes procuram a harmonização com um ideal de outrem, por modismo nas redes sociais, e acabam ficando insatisfeitos com os resultados por não mais se reconhecerem na frente do espelho.

Entrevista Nota 10 – O termo “harmonização facial” teve um aumento de 450% nas buscas do Google entre dezembro de 2019 e dezembro de 2020. Segundo o Instituto Harmonizando Faces, a procura continua crescendo, com um aumento de 50% no último semestre de 2022 em comparação ao início do mesmo ano. Apesar de já existir há um bom tempo, a que podemos ligar a ascensão contínua pelo serviço? Existe alguma influência para além da própria necessidade de aceitação de si? 

André Viana – Vejo como um reflexo da pandemia, onde as perdas foram ressignificadas na necessidade de viver o dia de hoje, de ser feliz agora. Muito tempo preso no seu eu fez com que muitas pessoas se conectassem com a sua essência. Houve uma descoberta do seu corpo e dos seus defeitos e uma constante necessidade melhorar. Outra possível justificativa é o apelo de mercado. Hoje essa indústria movimenta milhões de dólares por ano, e sua propaganda chega a todas as classes sociais. Nesse bote, não podemos deixar de mencionar que, mesmo sendo de custos questionáveis, houve um aumento no acesso a estes procedimentos. 

Outro aspecto que citamos é que a população está envelhecendo frente ao aumento da expectativa de vida na sociedade. Então a busca pelo envelhecer com dignidade também fez com que houvesse um aumento da procura de procedimentos estéticos faciais.

Dentro da odontologia podemos acrescentar que a HOF foi um casamento de sucesso, pois ela veio mostrar nossa excelência de senso estético, nossa destreza manual refinada, nosso conhecimento científico na área e nossa capacidade de transformação de resultados.

Entrevista Nota 10 – Para além da aceitação social, o movimento de mudanças estéticas pode promover benefícios à autoestima das pessoas ao se sentirem bem com o que veem no espelho. No entanto, a necessidade constante de mudar a própria aparência pode ainda gerar problemas para o indivíduo? 

André Viana – Alguns pacientes de harmonização desenvolvem esse comportamento de querer mais, de não ficarem satisfeitos com o resultado e de sempre quererem mais. Cabe ao profissional frear esse comportamento, mostrar para o paciente que os excessos são deletérios, que o sobretratamento não é o ideal. Nos dias atuais, a onda das grandes intervenções está ficando de lado e o aspecto de naturalidade vem ganhando destaque. Porém, na nossa prática, podemos nos deparar com pacientes que apresentam distúrbios de imagem e, nesses casos, uma abordagem multiprofissional se faz necessária.

Entrevista Nota 10 – Essa semana, no Mato Grosso do Sul, a Polícia Federal realizou operação contra um esquema criminoso de compra e venda de toxinas botulínicas sem registro da Anvisa para a realização de procedimentos estéticos de harmonização orofacial em clínicas odontológicas. Qual a importância de uma regulamentação e fiscalização desse mercado para o bem-estar social? Quais as dicas para ficarmos atentos na hora de buscar por esse serviço e evitar armadilhas como essa?

André Viana – Hoje todos os procedimentos em HOF são regulamentados, os insumos e equipamentos utilizados devem possuir inscrição na Anvisa. Os atos fiscalizatórios ainda são tímidos devido à capacidade fiscalizadora dos órgãos competentes, o que faz com que a população esteja exposta a riscos. Como já foi dito, [é preciso] escolher o profissional adequado e conhecer o histórico dele, assim como exigir informações sobre a procedência dos insumos e desconfiar do barato.