null Sênior sim, acomodado jamais: professores da Unifor inspiram as novas gerações

Qui, 6 Agosto 2020 18:20

Sênior sim, acomodado jamais: professores da Unifor inspiram as novas gerações

Conheça histórias de docentes da Universidade de Fortaleza que esbanjam disposição e curiosidade depois dos 60 anos


Sheila Pitombeira, professora de Direito Ambiental do curso de Direito da Universidade de Fortaleza (Foto: Ares Soares)
Sheila Pitombeira, professora de Direito Ambiental do curso de Direito da Universidade de Fortaleza (Foto: Ares Soares)

Como dar sentido à longevidade? Ao passo que a perspectiva de vida avança em todo o mundo, é preciso aprender a “rejuvelhescer”, algo como emprestar viço e vitalidade ao envelhecimento. É o que ensinam e aprendem os professores e as professoras sêniores da Universidade de Fortaleza (Unifor), instituição da Fundação Edson Queiroz. Encarando o passar dos anos sem medo e com disposição e curiosidade diante do novo, quem passou dos 60 esbanja produtividade e demonstra fôlego para dobrar a meta.

Menos julgamento, mais empatia

A cabeça hiperativa da procuradora de Justiça e professora de Direito Ambiental do curso de Direito da Universidade de Fortaleza (Unifor), Sheila Pitombeira, nasceu analógica, mas se viu desafiada a se tornar digital e, por último, tridimensional. “A tecnologia assusta, mas a nossa geração, que não conviveu desde sempre com o computador, soube bem fazer essa transição, mantendo o olhar retrospectivo de aprendizados anteriores. O contrário certamente seria mais difícil de acontecer porque transformações profundas exigem maturidade”, sentencia.

Ciente de que o avançar da idade pode inaugurar uma bela e produtiva fase na vida, a professora gosta do que vê no espelho: alguém que hoje tem a capacidade de decifrar fatos e emoções antes incompreensíveis e se percebe apta a ponderar, evitando julgamentos sumários e priorizando a empatia em suas relações sociais. Uma calma interior a serviço de um cotidiano agitado. Dividindo-se entre o Tribunal de Justiça do Ministério Público e a sala de aula – ainda virtual – na Unifor, Sheila Pitombeira não perde assento em comissões ligadas ao meio-ambiente, é fã e praticante da boa alimentação, faz tudo para manter a regularidade na prática do pilates e funcional, atenta para a necessidade de se manter hidratada, prefere ler e estudar à noite e jamais abriu mão do declarado gosto por cerveja.    

“Não tenho sequer pressão alta”, gabou-se, esbanjando saúde e vitalidade aos 63 anos. Na docência, ao invés de desacelerar, quer mais é somar. Por isso, avança na escrita de um projeto de pós-doutorado a ser em breve apresentado e tem planos para incrementar o Manual do Marco Legal do Saneamento Básico, a partir da perspectiva dos catadores de lixo, grupo-alvo de um projeto de extensão em curso que aposta justamente numa bagagem adquirida através do que chama de intercâmbio de saberes intergeracionais. “É o equilíbrio entre experiência vivida e a inovação que gera o verdadeiro progresso. Na docência, o ideal é que se tenha a convivência entre professores sêniors e mais jovens. Justamente porque eu terei experimentado questões jurídicas de uma época que os mais novos não viveram e nem vão encontrar nos livros ou artigos científicos. Portanto, um aprende com o outro”, defende. 

Aprender com o tempo, no entanto, não tem sido regra no país que assiste à sua ainda frágil democracia ser golpeada. Para a procuradora, após a promulgação da Constituição de 1988, o Brasil abriu caminho para o exercício da cidadania, mas vem sofrendo retrocessos no que se refere à manutenção de direitos sociais adquiridos, sobretudo quando se trata do idoso. “Tivemos um início de inclusão de quem tem mais idade considerando suas singularidades, mas perdas que acabam por praticamente anular as conquistas. Por exemplo: cada vez mais, jovens que não conseguem colocação no mercado passam a depender da aposentadoria dos idosos. Mas se houvesse justiça social no Brasil era para o idoso usufruir e não ter a responsabilidade de ainda sustentar a família”, problematiza.

Ao pensar em envelhecimento no Brasil, Pitombeira também lembra que há um decréscimo nos proventos de quem tem vida longa. “Em tese, está assegurada na Constituição de 1988 a questão da segurança financeira. No caso de marido e mulher, antes era assim: se um falecesse, o outro recebia a pensão, portanto se juntos ganhassem dois salários aquela continuaria sendo a renda, mesmo após o falecimento de um deles. Já não é mais assim. Sem falar que quando a idade avança a saúde onera. Aumentam os preços dos planos de saúde, dos tratamentos, dos remédios. E, por último, o fato de você ter que contribuir para a aposentadoria ao longo de 35 anos é retrocesso total, levando em conta que, em geral, não há colocação no mercado para quem tem mais de 60 anos”, observa a promotora. 

A corrida pela automação dos serviços também é alvo de críticas por quem vê as limitações próprias da idade avançarem em meio às supervalorizadas novidades tecnológicas. “A nova geração, hiperdigital, sentirá falta da assistência social. Tudo porque há muita tecnologia, mas o olhar social e humano não tem a mesma força. Temos todos os sensores tecnológicos de última geração e esquecemos a fisiologia humana. No caso dos idosos, até a digital se perde com tempo, então não é só apertar botões que tudo se resolve. Se não tivermos cuidado estaremos isolando os idosos ao final da vida deles em uma bolha virtual. E o ser humano precisa do convívio social. A pandemia está aí para provar isso”, assinala a inquieta professora que tem como marca a provocação do senso crítico de seus alunos através da interdisciplinaridade, ressaltando a importância da maturidade, para além do obrigatório conhecimento das leis.

Intelecto supersônico

Após 41 anos de docência, a atividade intelectual do professor Ricardo Silva Pontes, do curso de graduação em Engenharia Elétrica da Universidade de Fortaleza (Unifor), segue em velocidade supersônica e não dá qualquer sinal de cansaço. Aos 64 anos, ele se diz cada vez mais instigado e curioso diante das promessas de inovação proporcionadas pelas novas tecnologias. Por isso, procura estar sempre em dia com elas em seu habitat natural: o laboratório de máquinas elétricas voltadas à indústria. “Tudo o que é novo me anima. E é natural que seja assim na minha área. No tempo em que comecei não existia nem celular e hoje estou às voltas com projetos de pesquisa ligados à Internet das coisas, à nanotecnologia, à automação e à Indústria 4.0, orientando os TCCs dos alunos e desenvolvendo protótipos-modelos de motores para veículos elétricos que não tenho interesse em patentear, porque quando copiarem é bom que invento outros”, ri-se o inventor inveterado, hoje aposentando pela Universidade Federal do Ceará, mas para lá de atuante na Unifor.

Do tipo que não se nega a atender chamado de alunos a qualquer hora do dia ou da noite, o professor movido pelo fervilhar das ideias também nada diariamente, é torcedor apaixonado do Ceará, não abre mão de beber seu vinho ou brincar com o neto e diz manter o romantismo de um casamento que já dura 35 anos. Pensando lá na frente e preocupado com as novas gerações ainda quer ver, no entanto, o ganho de produtividade e o acúmulo de capital gerado pelas novas tecnologias se colocarem a serviço de forma mais igualitária a uma grande maioria da população. “Estamos assistindo à revolução 4.0, mas sempre lembro aos alunos que antes houve a 3.0 e no futuro teremos a 6.0 e por aí vai, quer dizer o avanço tecnológico acompanha a humanidade, mas é preciso observar que ganhos vêm deixando para as sociedades. Muito me preocupa atualmente a questão do domínio de massa da informação e da manipulação de dados, assim como as chamadas fake news. Isso precisa ser encarado de frente sem ferir a liberdade de expressão, porque é algo que pode desvirtuar economias e destruir reputações”, analisa.

Para ele, também é imperativo continuar botando a cabeça para funcionar enquanto tiver carro queimando óleo ou gasolina e destruindo o meio-ambiente. “Quem pesquisa erra e não pode ter medo do erro ou da persistência que a pesquisa exige. Por isso, não canso de inventar alternativas para, através da tecnologia, tentar deixar como legado às próximas gerações um mundo mais respirável e melhor. Nesse sentido, nada que eu tivesse feito na vida seria tão bom quanto ser professor. O conhecimento é universal e não tem idade ou envelhece. Tudo o que alguém pensou ou fez no passado eu posso fazer e aperfeiçoar no presente. Por isso que não ter medo do novo e de aprender é fundamental, sobretudo na fase madura da vida. E outra dica: os mais novos são mesmo os donos do pedaço. Todos os meus ex-alunos hoje são diretores de laboratórios e empresas gigantes pelo mundo. E é claro que sabem muito mais do que eu. Mas todos admitem que do nosso convívio é que vieram a se desenvolver e é essa relação de estímulo mútuo que nos renova enquanto mestres. Gosto de ver meus alunos crescerem rumo ao infinito e me renovo com eles”, destaca.  

Oração ao tempo

Tempo, tempo, tempo, tempo. Há 26 anos, o professor do curso de Odontologia da Universidade de Fortaleza (Unifor) e cirurgião-dentista Eliardo Silveira Santos conversou com o então chanceler Airton Queiroz (1946-2017) sobre uma pesquisa em desenvolvimento para a criação da saliva artificial, artifício que, à época, beneficiaria cerca de 30 pacientes acometidos com câncer de cabeça e pescoço que, devido à radioterapia, sofriam com a secura bucal. “Às vezes a gente pode achar que um número desses é irrisório e não vale o investimento ou esforço de pesquisa. Mas uma vida que seja importa e pensando como eu é que o chanceler me deu o aval para seguir em frente pesquisando. O resultado final foi a adesão e o aplauso do Brasil inteiro”, lembra o mestre e hoje também chefe do Serviço de Odontologia e presidente da Seção de Ensino, Aperfeiçoamento e Pesquisa (Seap) do Hospital Geral de Fortaleza.

O avançar dos anos não arrefeceu a curiosidade do pesquisador de 67 anos que, entre projetos de pesquisa sequenciais, desenvolveu mais recentemente um biofilme a base de água de coco em pó e semente da galactomanana, a baixo custo e com alto poder cicatrizante quando aplicado em feridas orofaciais decorrentes do mesmo câncer de cabeça e pescoço. É assim que, unindo experiência e uma curiosidade juvenil alimentada em sala de aula, o professor diz que “envelhecer descobrindo novos caminhos apontados pela Ciência para a melhoria do atendimento e da formação de jovens profissionais da área tem sido a melhor coisa do mundo”. Para ele, que cada vez mais tem prazer e tempo para estudar, nunca houve o peso da rotina, simplesmente porque nunca acreditou que na vida a gente nasce para ter uma só carreira profissional ou fazer a mesma coisa anos a fio. “Comecei como professor de Matemática e Ciência, fiz Pedagogia e só depois cursei Odontologia e fui fazer mestrado em cirurgia buco maxilo fácil, além do doutorado em Biotecnologia. O que eu lamento é que o dia só tenha 24 horas e o que me rejuvenesce e me realiza é usar o meu conhecimento em prol do meu paciente”, diverte-se. 

Após os 60 e dividindo-se entre a docência, as artigos e pesquisas científicas e a gestão hospitalar, a preocupação maior na atual fase é com os relacionamentos humanos. Para envelhecer bem, ele frisa, é preciso antes de tudo não se tornar um chato. “No mínimo eu tenho que ser menos chato do que você, entende? Por exemplo, eu não gosto de forró sertanejo, mas se me chamarem pra uma festa onde só toca esse tipo de dança eu vou dançar e beber cerveja a noite toda como se adorasse. Ou seja, a palavra-chave é tolerância. Você precisa aceitar as pessoas como elas são e adotar o lema de Madre Teresa de Calcutá: 'Ninguém vem a ti sem que volte melhor e mais feliz!'. Não é dizer sim só para agradar, mas se pode dizer um sim ao outro isso torna a vida de ambos bem mais fácil”, ensina o professor.

Preservar, mas também diversificar o círculo de amigos é outro segredo de vitalidade e alegria de viver. “Não devo ter só amigos dentistas e professores como eu. Conversar sobre outros assuntos amplia nossa visão de mundo. E também é importante cultivar a harmonia familiar. Adoro ser casado com a mesma mulher, Kátia, há 42 anos. Sou romântico e temos a nossa vida conjugal independente dos quatro filhos e 8 netos, que também adoramos curtir juntos, no Brasil e nos Estados Unidos, onde mora uma das filhas. Sempre dormi tarde e acordei cedo. Mantenho uma boa alimentação e sou igual a passarinho, adoro uma sementes, viu? Por último, mas não menos importante e fonte de saúde, é ser torcedor do Ceará, destaque isso, por favor”, gargalha, elencando afinidades eletivas que, segundo ele, também tem propriedades terapêuticas contra o mal envelhecimento.

A energia do acolhimento

Sete ponto dois de potência. Eis como a assessora pedagógica do Centro de Comunicação e Gestão (CCG) e professora do curso de Administração da Universidade de Fortaleza (Unifor), Ana Maria Cavalcante de Vasconcelos, calcula a idade e a energia que lhe move para exercer dupla função na instituição de ensino onde foi admitida em 2002, isso depois de ter largado um emprego federal para investir na carreira acadêmica. “Durante 20 anos da minha vida fui gerente de recursos humanos numa empresa, mas quando me vi estagnada lá dentro e sem perspectivas desafiadoras de trabalho resolvi correr atrás de um sonho antigo, ligado à academia e à docência. Com 50 anos, parti para o mestrado na Unifor, isso já com três filhos criados. Em seguida, veio a oportunidade de exercer a docência e essa é a minha paixão de todo dia. Ou seja, sonhar e correr atrás do que sonhamos não é coisa só de jovem não. É de quem se coloca sempre em movimento e está aberto a mudanças”, sustenta.

A mestre que também passou por duas especializações em sua área de conhecimento jamais admitiu viver uma vida sem propósito, ligada no automático. Para ela, ver sentido e significado naquilo que se propõe a fazer para interferir positivamente no mundo é a condição sine qua non para manter-se produtiva e interessada em oxigenar as idéias. Outro gatilho de vitalidade tem a ver com os vínculos afetivos que se formam no ambiente de trabalho. “Na sala de aula e na gestão pedagógica não sinto o peso da idade, é que se fossemos todos da mesma geração. Mas há algum tempo atrás ainda percebia sim um preconceito com pessoas mais velhas, sobretudo no meio empresarial, onde cheguei a participar dos processos seletivos. Na Universidade vem sendo diferente. Finalmente chegou o momento em que o olhar sobre quem tem mais experiência de vida e de trabalho é de reverência e respeito não só pelo conhecimento acumulado, mas por agregar expertises e sabedoria”, observa. 

Acolhimento é outra arte que na qual a professora é mestre e vem se aprimorando com o avançar da idade. Daí porque, na sala da assessoria pedagógica do CCG, não tem que desconheça o gosto bom do bolo que ela prepara e oferta sistematicamente aos colegas de trabalho. Também é hábito seu mandar mensagens motivacionais para muitos dos amigos e amigas próximas a cada manhã. “Acho que o tempo traz esse compromisso maior com quem lhe cerca e faz parte de sua rede de afetos. Então, nessa pandemia, passei a dar ainda mais atenção e carinho aos meus. Ligo todas as manhãs para aqueles que moram sozinhos para saber se estão bem ou precisando de algo e, como gosto muito de cozinhar, que é uma forma de doação, também costumo agradar ao paladar dos amigos. É um carinho, mas também uma forma de encontro possível nesses tempos de isolamento social, que para os idosos têm sido bem difícil e tenso, pelo fato de estarem ainda mais isolados e parados. Ninguém vive só e é com os outros que você areja sua mente e mantém aquecido o coração”, acredita.

Os 46 anos de casamento feliz também dizem muito sobre o que acredita ser uma fase de maior leveza entre os que convivem mais intimamente e amiúde. Ana Maria é do tipo que religiosamente faz questão de acordar cedo para tomar café da manhã com o marido médico, antes que os dois sigam para os trabalhos e só voltem a se ver à noite, quando também irão jantar juntos. A caminhada na praia também é uma prática do casal que ela enxerga como fonte de rejuvenescimento. Ler, estudar, manter atividade física regular e seguir à risca a dieta com suplementos vitamínicos e proteicos receitados pelo médico de confiança são outras práticas que levam a uma rotina prenhe de produtividade e, principalmente, sem estresse. “Não tenho pressão alta e decidi não sentir mais raiva também, por isso me afasto das coisas e pessoas tóxicas. Foi uma escolha que fiz na vida, seguindo um conselho da Cora Coralina, que num poema diz que cabe a mim decidir o caminho a seguir. Pois eu decidi ser superpositiva e adotar o slogan da Unifor: ensinando e aprendendo é que encontro equilíbrio e mantenho a energia em alta por 24 horas”, encerra.   

Pensa em estudar na Universidade de Fortaleza? 

Conheça as novas possibilidades de estudar com a gente no próximo semestre e juntos estaremos preparados para o futuro. Confira!

E caso estude em outra Instituição de ensino, venha para a melhor! Conheça nossa transferência simplificada com vantagens imperdíveis. Clique aqui e saiba mais