Precisamos falar de Reforma Tributária

Professor Fernando Veras Bezerra*

Como vimos na semana passada, o ministro Paulo Guedes e sua equipe econômica entregaram a suposta primeira parte da sua visão para a Reforma Tributária, chamada de Plano Mais Brasil, após mais de um ano de prazo inicial.

Você provavelmente já leu sobre os impactos da reforma em setores como o de serviço, mas o que você provavelmente não leu foi sobre os graves impactos em sua aposentadoria e os vícios jurídicos do Plano Mais Brasil.

Pois bem, um vício que não é exclusivo da equipe econômica é tratar os tributos PIS e COFINS como se fossem um instituto único e que sua união seria algo simples como empilhar peças de LEGO.

Com efeito, o PIS nasce pelo menos uma década antes da COFINS com o objetivo de sanar dois problemas do Brasil da década de 1970, que era a possibilidade do trabalhador de baixa renda poder auferir parte dos lucros do seu empregador e o custeio do seguro-desemprego.

Com o PIS, o trabalhador da iniciativa privada de baixa renda teria direito a um 14º salário, este no valor de um salário mínimo. Os efeitos do tributo são óbvios, pois, com a renda extra, o trabalhador usa o dinheiro e movimenta o mercado em um círculo virtuoso, sem falar que o custeio do salário-desemprego - sendo feito por tal contribuição - deixa de retirar dinheiro do que foi arrecadado com os impostos, permitindo o Estado gastar em outros setores.

De outro lado, a COFINS origina-se de uma evolução da contribuição FINSOCIAL feita no governo Collor com o intuito de sanar o déficit da previdência. Isso mesmo caro leitor, seus olhos não lhe enganaram, a COFINS tem como missão equacionar aquele tão falado déficit que justificou até mais uma reforma constitucional da previdência, a qual teve, entre outras consequências, a diminuição de benefícios como a pensão por morte e aumentou a idade mínima para que você possa se aposentar.

Dito isto, não precisamos ser exímios matemáticos para entender que a extinção da COFINS implicará em um crescimento exponencial do déficit, levando de forma indireta a uma situação de falência do sistema e forçando o brasileiro a se socorrer através da previdência privada, que é mais cara e menos abrangente que o modelo público, infelizmente, para a maioria esmagadora da população.

Do ponto de vista jurídico, os erros são tão infantis, meu caro leitor, que meus alunos da graduação na primeira prova da Disciplina de Direito Tributário não os cometeriam. Vamos listar os 3 principais erros formais que inviabilizam o projeto na forma que ele está. São eles:

1. Foi apresentado projeto de lei ordinária (PL nº 3887/2020), quando a Constituição exige projeto de lei complementar. Inclusive, o assunto resta pacificado no Supremo Tribunal Federal (STF) desde o final da década de 1990 com o julgamento da ADI 1.103 e mais recentemente, em 2014, com o julgamento em Repercussão Geral do RE 595.838.

Ou seja, todo manual básico de tributário explica essa necessidade da lei complementar, então por que o ministro Paulo Guedes apresentou o projeto desse jeito quando já existem até duas Propostas de Emenda a Constituição (PECs)?

A resposta ficarei devendo, pois somente o ministro e sua equipe poderão nos responder.

2. O Projeto cria hipótese de imunidade em seu artigo 21, quando imunidade é benefício exclusivo do texto constitucional, exigindo o uso da citada PEC para tal fim.

3. Como dito acima, o projeto de lei une a cobrança do PIS e da COFINS em um tributo chamado Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços – CBS sem mencionar como será feito o custeio da previdência e do seguro-desemprego.

Em mais de 130 artigos, apenas um, o artigo 125, aborda de forma super genérica que o custeio será mantido, sem precisar de que forma, se será integral ou não, em completo desrespeito ao exigido pela Constituição em seu art. 194, inciso VI.

Do jeito que está, a proposta tende a naufragar, pois o Brasil não aguenta mais retrocesso, em especial nas searas tributária e previdenciárias, vide os protestos que ocorrem no Chile mesmo em tempos de pandemia.

Professor Fernando Veras Bezerra

*Fernando Veras Bezerra é professor na Universidade de Fortaleza (Unifor) da disciplina de Direito Tributário na graduação e no curso de Especialização em Direito, Processo e Planejamento Tributários. Podcaster responsável pelos podcasts Sub Judice e Direito Unifor. Veja essa discussão em vídeo no Youtube ou no IGTV do nosso perfil @prof.fernandoveras.