Programa de Inclusão Sócio-Educacional promove a autonomia de crianças autistas

Projeto multidisciplinar é realizado pelo Núcleo de Atenção Médica Integrada (NAMI) da Universidade de Fortaleza

Em 2017, a Netflix, um dos maiores serviços de streaming de séries e filmes da atualidade, lançou a série norte-americana "Atypical" (foto), que mostra o cotidiano de Sam Gardner, um jovem autista de 18 anos. A produção tem quatro temporadas e mostra a dinâmica familiar e social do protagonista, enquanto ele, em busca de sua independência, atravessa a adolescência e entra na fase adulta.

O seriado chegou ao fim em julho deste ano, e foi muito aclamado por sua sensibilidade e veracidade ao retratar o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA). Atypical é apenas uma das diversas produções que estão surgindo atualmente com protagonistas que estão dentro do espectro. Mas, o TEA ainda gera dúvidas, e isso se deve ao fato do tema ser rodeado de estigmas e ser pouco debatido na sociedade.

Levando isso em consideração, a Universidade de Fortaleza, da Fundação Edson Queiroz, em busca de acolher e transformar a sociedade cearense em um coletivo cada vez mais socialmente inclusivo e acessível, desenvolveu, dentro do Núcleo de Atenção Médica Integrada (NAMI), um programa de atendimento voltado diretamente às crianças diagnosticadas com TEA.

Histórico e funcionamento

O Programa de Inclusão Sócio-Educacional (PROISE) existe há mais de dez anos, e surgiu da necessidade de auxiliar as crianças que, inicialmente diagnosticadas com Transtorno Global do Desenvolvimento (a sigla TEA ainda não era utilizada), apresentavam grandes dificuldades em suas habilidades sensoriais, cognitivas, motoras, de comunicação e/ou sociabilização, e tinham essas dificuldades como obstáculo na realização de suas atividades cotidianas.

Assim, o PROISE foi idealizado para ser um programa multidisciplinar, com a presença de profissionais de diversas áreas da saúde. Hoje, o serviço é composto por terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogas e psicólogas, e tem a capacidade de atendimento de, em média, 35 a 40 crianças, todas na faixa etária dos dois anos e meio até os quatro anos. Para os atendimentos, os pacientes são divididos entre o turno da manhã e o da tarde.

De acordo com Isis Falcão (foto), terapeuta ocupacional e responsável técnica dentro do Serviço de Reabilitação do NAMI, setor no qual o projeto se encontra, as crianças são atendidas em grupo, com o objetivo de favorecer e tornar o ambiente um potencializador e incentivador da comunicação e socialização dos pacientes. Com a pandemia, o número de atendimentos reduziu, mas, com a vacinação e a queda no número de casos, o serviço vai retornar com grupos de três profissionais e três crianças por sala.

Atividades realizadas

No PROISE, os profissionais desenvolvem atividades que objetivam estimular e potencializar as habilidades dos pacientes, além de trabalhar com o suporte familiar, dando orientações aos pais e cuidadores sobre questões relacionadas à rotina e à capacidade funcional dessas crianças. "O objetivo do nosso programa é que as crianças com TEA possam ser cada vez mais autônomas, e que desenvolvam as habilidades necessárias para serem crianças ativas e bem desenvolvidas tanto no ambiente escolar, como domiciliar e social", afirma a terapeuta ocupacional.

Para favorecer a autonomia dessas crianças, a equipe do programa utiliza atividades lúdicas, estratégias de comunicação alternativa e de treino de linguagem, assim como estímulos sensoriais e o "brincar funcional", que consiste em usar objetos da maneira apropriada a sua função, como, por exemplo, chutar uma bola ou andar com um carrinho na pista. O PROISE também auxilia na adaptação domiciliar e da rotina, sempre de acordo com o contexto no qual a criança está inserida.

 

Impacto social

Segundo Falcão, responsável pelo setor, o público atendido pelo PROISE vem da demanda do Sistema Único de Saúde (SUS). Assim, as famílias atendidas são aquelas que não têm condições de custear um serviço de atendimento privado. Porém, como o projeto possui uma equipe qualificada e multiprofissional, os pais e cuidadores contam com um suporte que favorece a compreensão do contexto sociofamiliar da criança e as dificuldades que ela apresenta.

“Esse serviço favorece que a comunidade tenha acesso a um atendimento de qualidade à criança ou à pessoa com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), que enxergue o paciente no contexto integral, que observe as suas dificuldades e favoreça suas potencialidades", destaca Ísis Falcão.

Importância acadêmica

Por ser estabelecido dentro do NAMI, os alunos do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da Unifor têm acesso direto ao setor. Isis Falcão conta que o PROISE conta o suporte de diversas disciplinas dos mais variados cursos do centro, e que, normalmente, recebe estagiários dos cursos de Psicologia e Fonoaudiologia.

"Como o nosso setor é interdisciplinar, os alunos da Unifor têm acesso a compreender, a entender e a participar de um atendimento que é voltado não somente para o paciente, mas também para a família, para os pais, e também compreender como funciona um atendimento interdisciplinar, onde os profissionais dialogam sobre as necessidades do paciente e trocam experiências", explica a profissional.

 

Sobre o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA)

O TEA é como um guarda-chuva: debaixo dele estão reunidas desordens do desenvolvimento neurológico que podem se apresentar desde o nascimento ou nas fases iniciais da infância. Algumas são: Autismo Infantil, Autismo Atípico, Transtorno Global do Desenvolvimento e a Síndrome de Asperger, entre outras.

De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais DSM-5, os sintomas mais comuns apresentados por pessoas dentro do espectro são: comportamentos repetitivos (estereotipias) e restritos, dificuldades na comunicação ou socialização, assim como interesses fixos e sensibilidade a estímulos sensoriais. No entanto, esses sintomas afetam os pacientes diagnosticados em intensidades diferentes.

Além disso, quem se encontra dentro do espectro também pode desenvolver habilidades prodigiosas, como uma excelente memória, alta capacidade de concentração em alguma área de seu interesse e uma atenção acima da média aos detalhes. É importante ressaltar que os transtornos abrangidos pelo TEA são permanentes, e acompanharão o indivíduo durante o resto de sua vida.

O autismo não tem cura, mas, é importante que o diagnóstico seja dado o quanto antes. Isso permite que o indivíduo receba um tratamento direcionado às especificidades do seu quadro. O acompanhamento deve ser multidisciplinar, englobando os mais diversos profissionais da área da saúde e o que mais for necessário para garantir um melhor desenvolvimento do paciente e uma melhor qualidade de vida para ele e sua família.