null Amor na contemporaneidade e as novas formas de se relacionar

Dom, 12 Junho 2022 08:00

Amor na contemporaneidade e as novas formas de se relacionar

Em referência ao Dia dos Namorados, comemorado em 12 de junho, o Unifor Notícias discute a liberdade de criar a própria definição de amor e a pluralidade dos relacionamentos contemporâneos


Entre o relacionamento à distância, a não-monogamia e o amor “eterno”, existe uma infinidade de conceitos que precisam ser discutidos (Foto: Getty Images)
Entre o relacionamento à distância, a não-monogamia e o amor “eterno”, existe uma infinidade de conceitos que precisam ser discutidos (Foto: Getty Images)

O amor sempre esteve presente ao longo da vida humana. Porém, seu conceito passa por transformações ao longo das épocas, refletindo as subjetividades dos tempos em que os indivíduos que o vivenciam estão inseridos. Se no passado a “regra” era pedir em namoro, casar, ter filhos e ficar juntos até a morte – nessa ordem –, hoje não é mais possível ditar um “passo a passo” nos relacionamentos amorosos. Cada pessoa/casal tem as próprias regras. Nesse sentido, as redes sociais, os aplicativos de relacionamento e a pluralidade de perfis pessoais e estruturas afetivas fazem com que tudo seja mais fácil e, também, complexo.

Para discutir os novos modelos de relacionamentos e o que se entende por amor na contemporaneidade, o Unifor Notícias conversou sobre os temas com docentes e estudantes da Universidade de Fortaleza, instituição de ensino da Fundação Edson Queiroz. Confira:

Amor líquido x amor romântico 

“[Estamos na era do] amor líquido [conceito criado por Zygmunt Bauman para definir relações superficiais e frágeis]? Sem dúvida vivemos uma revolução nos relacionamentos amorosos causada pelas tecnologias, somadas a uma característica importante da pós-modernidade: a ética individualista”, destaca a professora-doutora Aline Lira, do curso de Psicologia. Nessa ética, o indivíduo adquire valor central na busca por realizações íntimas e prazerosas, com ênfase na liberdade de escolha e na possibilidade de viver sem depender do outro.

Conforme a professora, em contrapartida ao “amor líquido” de Bauman, há o “amor romântico”, aquele idealizado em que existe atração emocional por outra pessoa, mas não requer atração sexual. Aquele amor conhecido “para a vida toda”, de almas gêmeas.

“Hoje, o que vivemos é a transição do amor romântico para o amor líquido, onde há pessoas vivendo essas duas realidades. Por exemplo, é raro um jovem dizer que quer casar, ter filhos; a prioridade é alcançar a independência financeira. Ter o relacionamento, muitas vezes, é um detalhe. Vivemos uma dicotomia entre aqueles que querem achar o amor de suas vidas e aqueles que não querem” - Aline Lira, professora do curso de Psicologia da Unifor (Foto: Arquivo pessoal)

Aline explica que existe uma “abundância” de relacionamentos que pode gerar “escassez” devido às exigências e imediatismo dos novos tempos. “Essa procura pelo amor constrói expectativas inalcançáveis, assim como uma busca pelo controle do relacionamento. E aí vem as frustrações, os desencontros, a certeza de que não podemos controlar o incontrolável”, analisa. 

“Existe uma diversidade de viver e amar. Se no ‘amor romântico’ prevalecia a configuração tradicional de casal hétero, hoje existe uma variedade de modelos, que decorrem de uma série de transformações sócio-históricas, desde o fenômeno da globalização às mudanças tecnológicas. Por outro lado, entretanto, as pessoas estão realizando mais suas necessidades íntimas e individuais”, conclui Aline. 

Segundo a docente, outro traço da contemporaneidade é a pluralidade de relacionamentos. Alguns dos conceitos mais recentes incluem o relacionamento homoafetivo; a monogamia ou não-monogamia; o “poliamor” e o relacionamento à distância.

GLOSSÁRIO 

- Relacionamento homoafetivo: acontece entre pessoas que sentem atração amorosa e sexual por pessoas do mesmo sexo. 

- Relacionamento monogâmico: ocorre quando duas pessoas vivem uma relação amorosa e/ou sexual exclusiva.

- Relacionamento não-monogâmico: é a possibilidade de estabelecer mais de uma relação ao mesmo tempo, desde que com a concordância de todos os envolvidos. 

- Poliamor: modelo de relacionamento simultâneo entre três ou mais pessoas ao mesmo tempo, e com o conhecimento de todos.

- Relacionamento à distância: quando um casal é separado geograficamente por longas distâncias. 

Confira os depoimentos:

A tecnologia pode ter um papel importante nos relacionamentos, pois é a partir dela que o contato diário pode ser mantido, sobretudo entre casais que namoram à distância. É o caso da estudante de Jornalismo Laura Teles: mais de 5 mil quilômetros a separam do namorado Guilherme Santiago, que mora na Europa.

Eles se conheceram em 2020 por meio do Instagram. No primeiro contato, ela já ficou sabendo que ele estudava Engenharia Civil na Universidade do Porto, em Portugal, mas que iria para o Brasil na semana seguinte. “Papo vai, papo vem, nós combinamos de nos encontrar quando ele viesse, mantivemos o contato e o resto é história”, relembra Laura. Para driblar a distância, o casal mantém contato virtual diariamente. Mas ela não nega que, em época de fim de semestre e provas, é sempre mais difícil. 


Guilherme Santiago e Laura Teles se conheceram pelas redes sociais (Foto: Arquivo pessoal)

“O abraço, o beijo, o carinho [físico] fazem falta por diversos fatores, mas sinto mais quando estamos cansados do dia e só queremos relaxar e ficar quietos. A tecnologia ajuda demais nesse processo! Conseguir vê-lo ao vivo na tela do  celular já diminui bastante a saudade, assim como as mensagens que permitem o diálogo durante o dia, para saber como o outro está. Não é fácil, mas pela pessoa certa faz valer a pena o esforço”, destaca.

Sem esconder a ansiedade de estar com Guilherme, Laura ressalta que vai a Portugal em breve conhecer o país e visitar o namorado. “Nunca viajei para fora do Brasil, juntei o útil ao agradável”, conta a futura jornalista.
 

Lune Alves faz parte do Laboratório de Estudos sobre Processos de Exclusão Social da Unifor, e conheceu Alex Fernandes na calourada de boas-vindas do curso de Psicologia. “Elus” preferem ser tratades no gênero neutro (em oposição aos artigos “ele” e “ela”, pessoas não-binárias preferem os artigos neutros, como “ile” ou “elu”), conforme faremos a partir de agora. 

Elus são transgêneros não-binários; ou seja, não se identificam com o gênero atribuído ao nascer. No entanto, não acreditam na ideia binária de gênero, resumida em masculino e feminino, daí o termo não-binário. “Nossa proximidade se deve muito à causa trans, que nos uniu”, diz Lune. Juntes há três anos, Lune e Alex, são fruto de uma nova safra de relacionamentos contemporâneos, os não-monogâmicos, e se relacionam afetiva e sexualmente com outras pessoas.


Lune Alves e Alex Fernandes, juntes há três anos, são estudantes de Psicologia (Foto: Ísis Rebouças)

“Me vejo como uma pessoa que rompe a estrutura da hierarquia relacional [oposição a lógica monogâmica], o que me permite me relacionar afetivamente com outras pessoas, além de Alex. Vejo a não-monogamia como algo político, porque algumas estruturas, obrigatórias, passam a ser fruto de escolhas pessoais, não mais imposição social”, defende Lune.

Diante de tanta diversidade, não há regras universais, o que prevalece entre elus sempre é o diálogo. Os princípios, porém, são básicos: respeito, companheirismo, empatia e união. “Para não ferir o outro, basta conversar. Buscamos não ter receio na hora de falar, ser sincero e ter liberdade”, resume Alex.

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O amor no campus inspira! Foi no hall do Bloco D da Unifor que a egressa e, hoje, professora do curso de Arquitetura e Urbanismo, Nathalie Guerra, conheceu o amor da sua vida. “Eliezer, que também é arquiteto, estava alguns semestres na frente e se formou dois anos antes de mim. Mas chegamos a cursar algumas disciplinas juntos”, relembra a professora.

Nathalie Guerra, Eliezer, e os filhos, Eliezer Filho, 2, e Gabriela, 7.  (Foto: Arquivo pessoal)

Na Unifor, o casal passou por muitas conquistas, dificuldades e momentos de estudos. “Marcou muito nossas vidas, pois foi lá que nos conhecemos e compartilhamos muitos momentos de crescimento pessoal e profissional. Até hoje passear pela Unifor me faz lembrar do nosso início de relacionamento”, conclui.

Hoje, Nathalie e Eliezer estão casados há nove anos e têm dois filhos: Eliezer Filho e Gabriela. Uma história de amor que começou nos corredores da Universidade e que mudou para sempre a vida dos egressos.